Marco Adolfs
Meu trabalho começou em uma noite chuvosa, quando entrei no bar de Loirinha. Um bar muito frequentado e luminoso do centro da cidade. Um local de bêbados, toxicômanos, prostitutas e perdidos de toda espécie. Uma gente que passava quase todos os dias pelas mesas daquele estabelecimento, como se ali fosse o prolongamento de suas casas; de suas famílias imaginadas; ou mesmo da rua afunilada. Um bar que ficava aberto durante toda a semana e até as altas e solitárias horas da noite e da madrugada. Um local com um som de bolero sempre inundando os ouvidos de todos. O bar era uma casa antiga reformada, com três enormes portas de madeira que davam para um grande salão onde podia se ver diversas mesas dispostas com suas toalhas de xadrez, o que lhe proporcionava levemente um ar de restaurante italiano. À direita tinha um extenso balcão, todo em madeira, onde bêbados solitários costumavam sentar com seus queixumes. Atrás desse balcão viam-se dezenas de garrafas de bebidas expostas em prateleiras de vidro e, por um buraco aberto, a cozinha misteriosa. Caminhando-se pelo bar, nos fundos podia se perceber os banheiros com os nomes “damas” e “cavalheiros”, escritos em plaquetas de acrílico. Naquela noite especial fui convidado a ir até uma sala reservada, bem ao fundo do bar, que servia de escritório. O escritório de Loirinha. Uma sala pequena com uma mesa de tampo de vidro, onde se espalhavam diversos papéis e objetos variados; uma televisão a um canto; um frigobar e um estofado vermelho. Ela ligou o ar-condicionado e sentou-se no estofado, convidando-me para sentar a seu lado. Tirei meu agasalho; depositei o guarda-chuva a um canto e dei um sorriso na direção de Loirinha, agradecendo. Quando finalmente me sentei, senti-me não só aliviado do peso da chuva lá fora, mas também alegre por dar início ao meu trabalho de jornalista que queria escrever um livro sobre a vida de uma pessoa. Eu me sentia um pouco tenso por ter escolhido a vida de uma amiga minha para contar a história. Sabia de antemão que o meu trabalho estaria envolvido por uma carga emocional muito grande Tentava relaxar a minha ansiedade.
Loirinha agora era uma mulher já passando dos quarenta e de um olhar triste e melancólico. Seus cabelos eram longos, sempre amarrados por uma fivela; e seu corpo parecia não ter mudado a silhueta esbelta e bem torneada de mulher sensual. Sua boca, de lábios carnudos, tentava sorrir quando veio até mim. Um sorriso desconfiado e maroto de mulher forte e madura.
– Você não vai mesmo se importar de contar a sua história de vida, vai? – perguntei-lhe logo de imediato, querendo ter uma certeza maior sobre o que eu pretendia iniciar.
– Não tenho nada a esconder – respondeu Loirinha. Em seu rosto transparecia certa frieza e indiferença sinceras.
– Uma vida extraordinária? A minha? Em quantos capítulos? – ela perguntou, esboçando um sorriso cínico.
– O suficiente para mandar a mensagem – respondi.
(Continua na próxima semana...)