Amigos da Alcova

domingo, 30 de maio de 2021

Poema das tuas mãos

                                                           Violeta Branca (1915-2000)

 

As tuas mãos nervosas, quentes, largas,

harpejam nos meus sentidos

a música ideal da emoção.

 

Para os teus dedos criadores,

sou o piano mágico vibrando

ao influxo de tua ardente inquietação.

 

Tuas mãos frementes,

arrancam angústias sonorizadas

de meus nervos,

que se retesam como cordas harmoniosas.

 

Tuas mãos imperiosas,

tuas mãos rebeldes,

cantam silenciosas aleluias de gestos,

quando compõem poemas de volúpia,

gritos incontidos de alegria pagã,

correndo ligeiras,

leves,

torturantes,

no teclado branco de meu corpo...


domingo, 16 de maio de 2021

Os quatro elementos – A água

Vinicius de Moraes (1913-1980)


IV – A água

 

A água banha a Amada com tão claros

Ruídos, morna de banhar a Amada

Que eu, todo ouvidos, ponho-me a sonhar

Os sons como se foram luz vibrada.

 

Mas são tais os cochichos e descaros

Que, por seu doce peso deslocada

Diz-lhe a água, que eu friamente encaro

Os fatos, e disponho-me à emboscada.

 

E aguardo a Amada. Quando sai, obrigo-a

A contar-me o que houve entre ela e a água:

– Ela que me confesse! Ela que diga!

 

E assim arrasto-a à câmara contígua

Confusa de pensar, na sua mágoa

Que não sei como a água é minha amiga.

 


domingo, 2 de maio de 2021

Os quatro elementos – O ar

 Vinicius de Moraes (1913-1980)

 

III – O ar

 

Com mão contente a Amada abre a janela

Sequiosa de vento no seu rosto

E o vento, folgazão, entra disposto

A comprazer-se com a vontade dela.

 

Mas ao tocá-la e constatar que bela

E que macia, e o corpo que bem-posto

O vento, de repente, toma gosto

E por ali põe-se a brincar com ela.

 

Eu a princípio, não percebo nada…

Mas ao notar depois que a Amada tem

Um ar confuso e uma expressão corada

 

A cada vez que o velho vento vem

Eu o expulso dali, e levo a Amada:

– Também brinco de vento muito bem!


 

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