Marco Adolfs
Enquanto eu estava sendo estuprada, a cruz, no alto daquela igrejinha, parecia a visão da única possibilidade de existência onde me agarrar. Não é estranho? Depois que eu compreendi melhor o mundo e fiquei sabendo da ideia da salvação que a cruz carrega... Como símbolo, Cristo e tudo o mais... Sabe, nunca me importei muito em rezar... Orar? Mas não é isso o que as pessoas que desejam agradecer ou pedir a esse Deus geralmente fazem? Sempre busquei corpos para a sobrevivência pura e simples. Agi como uma devassa completa. Desejei homens com atitudes. Procurava viver e concordar com as iniciativas deles. Sabia que um dia tudo isso acabaria. Eles impunham suas vontades de machos e eu os recebia passivamente. Eles me abordavam com suas palavras de convencimento e eu cedia. Tudo muito fácil. Um mal necessário? Um bem? Um nada?...
Eu escutava atentamente aquele desabafo, quase concordando com tudo.
– Eu quero então lhe pedir uma coisa – disse Loirinha, saindo de seus devaneios.
– Peça – eu disse, calmamente.
– Me leva a uma igreja – completou Loirinha.
Por um momento fiquei em silêncio, não acreditando no que ouvira.
– Pra quê? – perguntei curioso.
Loirinha bebeu mais um gole de vinho e disse.
– Quero agradecer por tudo o que aconteceu comigo.
Naquela tarde de um sol vermelho tinto-sangue, eu levei Loirinha até uma igreja como ela me pediu. Ao entrarmos, a missa já havia começado. Pegamos um lugar em um dos bancos dispostos nas laterais e sentamos. Logo, o padre que oficiava a missa solicitou aos fiéis que todos se ajoelhassem. Loirinha imediatamente obedeceu. Quando todos começaram a rezar eu pude perceber que Loirinha parecia balbuciar uma oração. Fiquei extremamente emocionado ao notar uma lágrima escorrendo pela sua face. “Estranha espiritualidade... Mas teria sido esse o final escolhido por ela, desde o começo?”, pensei.