Amigos da Alcova

domingo, 22 de dezembro de 2019

Soneto 832 da luxúria


Glauco Mattoso


Pensei que insaciável era a puta
que fode por prazer, mais que por grana!
Que nada! Um velho ainda é mais sacana
e nunca satisfaz a rola hirsuta!

Na foda, pela língua ele permuta
a frágil ereção: o odor que emana
da velha sem pudor na suja xana
lhe dá mais apetite que uma truta!

Assanha-se o ancião quando a consorte
tem cócegas por dentro! Então chupita
o caldo que, escorrendo, fede forte!


Qual sopa, chá, nem suco! Ressuscita
aquele exausto membro, em grande porte,
o gosto da sardinha antes de frita!

domingo, 8 de dezembro de 2019

poeminha poemeto poemeu poesseu poessua da flor



Décio Pignatari (1927-2012)


a brisa
a luz
o calor

tateiam

bolinam a flor
quase vexada

e ela, voláteis,
perfumadas de cor-de-rosa
aos poucos
vai abrindo as pérnalas em vãos
num copo à janela

domingo, 24 de novembro de 2019

Um sorriso



Ferreira Gullar (1930-2016)


Quando
com minhas mãos de labareda
te acendo e em rosa
embaixo
te espetalas

quando
com o meu aceso archote e cego
penetro a noite de tua flor que exala
urina
e mel
que busco eu com toda essa assassina
fúria de macho?
que busco eu
em fogo
aqui embaixo?
senão colher com a repentina
mão do delírio
uma outra flor: a do sorriso
que no alto o teu rosto ilumina?


segunda-feira, 28 de outubro de 2019

Centaura



José Paulo Paes (1926-1998)


A moça de bicicleta
parece estar correndo
sobre um chão de nuvens.

A mecânica ardilosa
dos pedais multiplica
suas pernas de bronze.

O guidão lhe reúne
num só gesto redondo
quatro braços.

O selim trava com ela
um íntimo diálogo
de côncavos e convexos.

Em revide aos dois seios
em riste, o vento desfaz
os cabelos da moça

numa esteira de barco
– um barco chamado
Desejo onde, passageiros

de impossível viagem,
vão todos os olhos
das ruas por que passa.



domingo, 29 de setembro de 2019

A pica ressuscita a mulher morta



Francisco Moniz Barreto (1804-1868)


A pica o instrumento é que no mundo
Mais milagres tem feito e mais proezas;
A pica o melhor traste é das belezas,
Mal que começa a lhes coçar o sundo.

A pica é o cão, que avança furibundo
A plebeias, fidalgas e princesas;
A pica em chamas Troia pôs acesas,
E a Dido fez descer do Urco ao fundo.

É a pica – carnal, possante espada,
Que o mundo, perfurante, emenda, entorta,
E tudo vence, como bem lhe agrada.

A pica, ora é calmante, ora conforta;
Sendo em dose alopática aplicada,
A pica ressuscita a mulher morta.



sexta-feira, 6 de setembro de 2019

Metempsicose



Antero de Quental (1842-1893)


Ardentes filhas do prazer, dizei-me!
Vossos sonhos quais são, depois da orgia?
Acaso nunca a imagem fugidia
do que fostes em vós se agita e freme?

Noutra vida e outra esfera, aonde geme
outro vento, e se acende um outro dia,
que corpo tínheis? Que matéria fria
vossa alma incendiou, com fogo estreme?

Vós fostes, nas florestas, bravas feras,
arrastando, leoas ou panteras,
de dentadas de amor um corpo exangue...

Mordei, pois, esta carne palpitante,
feras feitas de gaze flutuante...
Lobas! Leoas! Sim, bebei meu sangue!

domingo, 21 de julho de 2019

O labirinto das vulvas



Claudio Rodríguez Fer


Todo labirinto sai do meio das virilhas,
onde os centro se bifurcam em ípsilon
para a morada matriz, vagina e vulva.

Nunca muros nos óvulos do universo
e nunca túneis para vermes de luz:
o machado ritual de dois gumes
batendo nos lábios das vulvas vasilhas
com as suas asas de borboleta urgente
até que estalam rizomas de açafrão infinito.

Touros brancos ruminam tempo e espaço
de donas das bestas com felinos na testa:
a das serpes no colo e nos braços,
a das cobras apanhadas com as mãos,
a dos peitos da vida oferendada
pelo ubres das vacas do leite preto.

São as bestas vermelhas do lírio
queimando o fio do novelo dos fluxos
nas ondas telúricas da vagina da terra,
onde voam as golfinhas nuas,
onde nadam as perdizes despidas,
onde pasce estrelas o minotauro azul.

Útero labirinto das vulvas,
labareda de lábeis lábios
em limiares de limiares sem limites.
(Cnossos, Creta)

(Trad. Saturnino Valladares)



domingo, 30 de junho de 2019

Kama



                              Nei Leandro de Castro


a mulher oferta
sua antropofágica
flor aberta.
O homem aceita e recusa
aceita e recusa
aceita e recusa
aceita e recusa.
Não podendo mais,
toma-a de assalto
e morre em paz.

domingo, 26 de maio de 2019

Mim dobra!



Múcio Teixeira (1857-1928)


Eu vi-a dormindo, com as mãos entre as coxas,
as nádegas roxas, a crica a pingar...
E vinham-lhe ao ventre quebrar-se em desmaios
os pálidos raios de um morno luar.

Que noite!... Que foda! Que leite de pica
no fundo da crica lhe fui entornar!...
Que anseios! Que gostos! Por vê-la fodida,
de crista caída – fiquei a babar...

E a porra sumia-se... e eu tinha desejos
de encher-lhe de beijos o cono vermelho.
Porém a potência já vai me faltando,
e eu, triste, brochando, penteava o pentelho...

Quando ela pedia mais uma, gemendo,
cheguei-me tremendo, já quase a tocá-la;
propícia era a hora, pois amanhecia...
e eu sinto de dia mais gosto na gala...

Mas, antes da porra se erguer novamente,
senti de repente que o sol já fulgia:
a triste banhou-se, vestiu-se, zangada...
e a porra, qual nada! Mais murcha pendia...

E eu vi-a dormindo, com as mãos entre as coxas,
as nádegas roxas, a crica a pingar...
nem mesmo o de mijo tesão matutino
me enrija o pepino depois de acabar.



sábado, 11 de maio de 2019

Adormecida


Castro Alves (1847-1871)


Uma noite, eu me lembro... Ela dormia
Numa rede encostada molemente...
Quase aberto o roupão... solto o cabelo
E o pé descalço do tapete rente.

‘Stava aberta a janela. Um cheiro agreste
Exalavam as silvas da campina...
E ao longe, num pedaço de horizonte,
Via-se a noite plácida e divina.

De um jasmineiro os galhos encurvados,
Indiscretos entravam pela sala,
E de leve oscilando ao tom das auras,
Iam na face trêmulos – beijá-la.

Era um quadro celeste!... A cada afago
Mesmo em sonhos a moça estremecia...
Quando ela serenava... a flor beijava-a
Quando ela ia beijar-lhe... a flor fugia...

Dir-se-ia que naquele doce instante
Brincavam duas cândidas crianças...
A brisa, que agitava as folhas verdes,
Fazia-lhe ondear as negras tranças!

E o ramo ora chegava, ora afastava-se...
Mas quando a via despeitada a meio,
P’ra não zangá-la... sacudia alegre
Uma chuva de pétalas no seio...

Eu, fitando esta cena, repetia
Naquela noite lânguida e sentida:
“Ó flor! – tu és a virgem das campinas!
Virgem! – tu és a flor de minha vida!...”



domingo, 7 de abril de 2019

Passeio no campo



Florbela Espanca (1894-1930)


Meu Amor! Meu Amante! Meu amigo!
Colhe a hora que passa, hora divina,
Bebe-a dentro de mim, bebe-a comigo!
Sinto-me alegre e forte! Sou menina!

Eu tenho, Amor, a cinta esbelta e fina...
Pele doirada de alabastro antigo...
Frágeis mãos de madona florentina...
– Vamos correr e rir por entre o trigo! 

Há rendas de gramíneas pelos montes...
Papoilas rubras nos trigais maduros...
Água azulada a cintilar nas fontes...

E à volta, Amor... tornemos, nas alfombras
Dos caminhos selvagens e escuros,
Num astro só as nossas duas sombras!...

domingo, 10 de março de 2019

Depois do pecado



Sosígenes Costa (1901-1968)


Deus fez a folha da vinha
para cobrir a nudez
do elegante almofadinha
e do rude camponês.

E, dentre as folhas da parra,
Deus fez uma cor-de-rosa
para cobrir mais bizarra
o corpo da melindrosa.

Deus fez a folha da uva.
Porém Satã não gostou
e fez então a saúva

que essa folha esburacou.
A linda folha celeste
ficou portanto escabrosa.

Eis porque a melindrosa
quando agora a folha veste
fica tão indecorosa.

domingo, 17 de fevereiro de 2019

Respeito é bom, e eu gosto!



Leila Miccolis


A sonhos imorais
eu não sou dada:
até minhas curras
são bem-comportadas...

domingo, 13 de janeiro de 2019

Célio, nossa Lésbia



Catulo (87-54 a.C.) 

Célio, nossa Lésbia,
Lésbia,
a Lésbia que Catulo amou
mais do que a si mesmo e do que aos seus
agora
em becos e bibocas
suga os membros
(gulosa)
da estirpe magnânima de Remo.

(Trad. Haroldo de Campos)

Voyeurs desde o Natal de 2009