Amigos da Alcova

sábado, 18 de junho de 2016

O dia seguinte


Carvalho Junior (1855-1879)


Quando, pela manhã, contemplo-te abatida
Amortecido o olhar e a face descorada,
Imersa em languidez profunda, indefinida,
O lábio ressequido e a pálpebra azulada,

Relembro as impressões da noite consumida
Na lúbrica expansão, na febre alucinada,
Do gozo sensual, frenético, homicida,
Como a lâmina aguda e fria de uma espada.

E ao ver em derredor o grande desalinho
Das roupas pelo chão, dos móveis no caminho,
E o boudoir, enfim, do caos um fiel plágio,

Suponho-me um herói da velha Antiguidade,
Um marinheiro audaz após a tempestade, 
Tendo por pedestal os restos dum naufrágio!

sábado, 4 de junho de 2016

Pode apalpar, pode ver


Laurindo Rabelo (1826-1864)


MOTE

Pode apalpar, pode ver,
Das coxinhas pode usar,
Por fora quanto quiser,
Dentro não, que hei de gritar!


GLOSA

– Meu benzinho, que desgosto
Me está causando você;
Sua boquinha me dê,
Para mim volte o seu rosto.
– Eu consinto no seu gosto,
Porém não ha de meter,
E se deseja saber
Se ainda tenho cabaço,
Com todo o desembaraço
Pode apalpar, pode ver.

– Aqui está! Meta o dedinho
Na cavidade do centro;
Não me carregue pra dentro
Que me magoa o coninho;
Não esteja tão tristezinho
Por eu não me franquear;
Você me quer desonrar!
Olhe, eu lhe faço um partido,
Se é pra ser meu marido,
Das coxinhas pode usar.

 A coisa pode encostar
Por fora, não tenha susto;
E, se quer prazer mais justo,
Pode os peitinhos chupar.
Em tudo deixo pegar,
Mas só faça o que eu disser,
Pois se minha mãe souber
Que você... Ai! Ai! Que dor!
Ai!... Dentro não, meu amor!...
Por fora, quanto quiser!

– Já vai você, minha vida,
Sua coisinha metendo...
A pomba me está doendo...
Eu já me sinto ferida;
Não me queira ver perdida...
Vá pedir-me pra casar...
Meu Deus!... E ele a teimar...
Olhe que eu me vou embora...
Se quiser venha-se fora, 
Dentro não, que hei de gritar!

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