Amigos da Alcova

sábado, 16 de julho de 2016

Aforismos poéticos – quer pica


Francisco Moniz Barreto (1804-1868)



A mulher, que do marido
Na ausência com tudo implica,
E nos pobres servos malha –
Por dá cá aquela palha –
Quer pica.

A donzela, que tem flatos,
E a todos diz que entisica,
E passa, lendo novelas,
Toda noite, ou nas janelas,
Quer pica.

Moça enferma, que – em remédios
Não tomar – teimosa embica,
Não quer outra medicina,
Quer cristel por onde urina,
Quer pica.

Virgem, que, dando em beata,
Só aos templos se dedica,
Não aspira à eterna glória;
Isso é impostura, é história;
Quer pica.

Noiva, que, assim que anoitece,
Pede o chá; e, mal debica,
Quebrando os olhos, se fila
Do noivo ao ombro, e cochila,
Quer pica.

A viúva, que seus males
A todos, chorando, indica,
A ver se alma piedosa
De novo, a de pronto, a esposa,
Quer pica.

Noviça, que se enfurece,
E como possessa fica,
Por não poder ir à grade
Nem falar c’o primo frade,
Que pica.

Abadessa, ainda fresca,
Que presentes de canjica
E milhos – por São João –
Manda ao padre capelão,
Quer pica.

Quando muito presenteia
Ao pobre a fidalga rica,
Não é por ser liberal,
Não senhores; não há tal;
Quer pica.

Todo homem quer dinheiro,
Todo caralho quer crica,
Toda criança quer mama,
Toda mulher para a cama
Quer pica.

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