Soror
Violante do Céu (1601-1693)
Amante
pensamento,
Núncio de
amor, terceiro de vontade,
Emulação do
vento,
Lisonja da
mais triste soledade;
Ministro da
lembrança,
Gosto na
posse, alívio na esperança,
Já que de
minhas queixas
A causa
idolatrada vás seguindo,
Dize-lhe
qual me deixas,
Dize-lhe que
estou morta, mas sentindo,
Que pode mal
tão forte
Fazer que
sinta, ai triste, a mesma morte.
Dize-lhe que
é já tanto
O pesar de
me ver tão dividida,
Que só me
causa espanto
A sombra que
me segue de uma vida
Tão morta
para o gosto
Como viva, ai
de mim, para o desgosto!
Dize-lhe que
me mata
Quem,
vendo-me morrer sem resistência,
De
socorrer-me trata,
Pois, para
quem padece o mal d’ausente,
Que é só
remédio, entendo,
Ver o que
quer, ou fenecer querendo.
Dize-lhe que
a memória
Toma por
instrumento do meu dano
A já passada
glória;
Fazendo o
mais suave tão tirano,
Que obtém
mais estimado.
Me passa o
coração, porque é passado.
Dize-lhe que
se sabe
O poder de uma
ausência rigorosa,
Que a que
começa acabe,
Antes que
ela me acabe poderosa;
Pois de tal
modo a sinto,
Que julgo por
eterno o mais sucinto.
Dize-lhe que
se admite
Rogos de um
coração que o segue amante,
Que ver-me
solicite,
Apesar do
preciso e do distante;
E que tão
cedo seja,
Que toda a paixão
se torne inveja.
Dize-lhe que
se acorde
De uns
efeitos d’amor que encarecia;
E que todos
recorde;
Mais que
seja um minuto cada dia,
Pois, eu cada
minuto,
Infinitas
lembranças lhe tributo.
Dize-lhe que
até a morte
Assistência
contínua lhe ofereces
E que te
invejo a sorte;
E enfim se do
meu mal te compadeces
Oh,
pensamento amigo,
Dize-lhe
tudo, ou leva-me contigo.