Amigos da Alcova

sexta-feira, 2 de março de 2012

Omissão

João de Deus (1830-1896)



Uma noviça, jovem de talento
na arte do desenho e da pintura,
pede à madre abadessa do convento
o favor de lhe ver uma figura.

Era a imitação escrupulosa
de um menino em tamanho natural
que pertencia a soror Ana Rosa,
tido em conta de um belo original!

A soror costumava, por decência,
tê-lo com uma tanga pequenina
que lhe encobria aquela saliência
que distingue o menino da menina.

Mas uma tanga tão apropriada
no tecido e na cor que, na verdade,
a gente olhava e não lhe via nada
que desmentisse a naturalidade.

Era, pois, de esperar que a nossa artista,
assim como no mais, naquela parte
pintasse apenas o que tinha à vista
que é o preceito e o primor da arte.

Vê a madre abadessa a maravilha
e não se cansa de a louvar! Mas lança
a vista atenta àquele ponto: “Ai, filha,
que falta essencial!... Pobre criança!

Que pena! O colorido, que beleza!
pernas, braços e tudo, que perfeito!
mas confesso... Confesso com tristeza...
que enorme, que enormíssimo defeito!”

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